As negociações de paz entre Ucrânia e Rússia atingem uma nova fase nesta terça-feira (2), com o enviado especial de Donald Trump, Steve Witkoff, se reunindo em Moscou com o presidente Vladimir Putin para discutir ajustes na proposta apresentada por Washington. Witkoff será acompanhado por Jared Kushner, conselheiro e genro do presidente americano.
Artur Capuani, correspondente da RFI em Bruxelas
O encontro acontece após duas rodadas de negociações entre Estados Unidos e Ucrânia na Flórida, nas quais os ucranianos buscaram revisar um plano inicialmente visto como favorável à Rússia. O documento previa limitações ao tamanho do Exército ucraniano e a perda de territórios ocupados, medidas consideradas inaceitáveis por Kiev.
Nesse contexto pró-Moscou, a União Europeia se articula para não ser escanteada na discussão. Ontem, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, esteve em Paris, onde foi recebido pelo presidente francês, Emmanuel Macron. Eles participaram de videoconferência com líderes de países como Reino Unido, Alemanha, Itália, Polônia e representantes da cúpula da União Europeia. Também conversaram por vídeo com o negociador ucraniano, Rustem Umerov, e Steve Witkoff.
Em Bruxelas, os ministros da Defesa do bloco se reuniram para tentar chegar a um consenso sobre como seguir com o apoio financeiro a Kiev, incluindo a possibilidade de cooperação industrial militar e financiamento privado por meio do Banco Europeu de Investimento.
A reunião em Moscou é determinante. Kiev se vê enfraquecida em meio a uma crise política, perdas no front de batalha e um duro inverno à vista, além da hesitação de Bruxelas em relação ao suporte financeiro. Agora é Moscou que terá de reagir às alterações discutidas na proposta de paz, o que deve definir o rumo das próximas semanas. A Casa Branca disse estar otimista quanto à possibilidade de um acordo para pôr fim à guerra, embora experiências anteriores mostrem que o caminho ainda é incerto.
A situação interna da Ucrânia adiciona complexidade às negociações. O país enfrenta seu maior escândalo de corrupção desde o início da guerra, com a demissão do chefe de gabinete de Zelensky, que liderava a equipe de negociações, a demissão de dois ministros e a investigação de um ex-sócio do presidente. Ao mesmo tempo, a Rússia mantém a pressão militar com avanços territoriais e sucessivos ataques à infraestrutura energética, deixando milhares de ucranianos sem aquecimento.
Situação confusa em Pokrovsk A Rússia reivindicou nesta segunda-feira (1º) a tomada de Pokrovsk, um importante centro logístico do leste da Ucrânia, e da localidade de Vovchansk, no nordeste. Pokrovsk é uma posição estratégica, já que está na encruzilhada de várias estradas e linhas férreas que levam aos últimos bastiões das tropas ucranianas no front oriental.
Nesta terça, o exército ucraniano declarou, no entanto, que ainda controla a parte norte da cidade, apesar da declaração de vitória de Putin.
Europa avalia uso de ativos russos congelados Um dos temas mais sensíveis é o uso dos ativos russos congelados na Europa. Dos € 300 bilhões congelados, € 185 bilhões estão na Bélgica, sob custódia do Euroclear. A União Europeia debate a melhor forma de utilizar esses recursos sem ceder controle total aos Estados Unidos.
A pesquisadora Jana Kobzova, do think tank Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR), destaca a importância desse ponto: “A Europa pode influenciar de forma significativa o acordo de paz se agir rapidamente nesse tema. Merz e outros devem intermediar um acordo e superar as preocupações da Bélgica. Eles deveriam vincular essa ação a um escrutínio rigoroso das dimensões comerciais da proposta entre Estados Unidos e Rússia, insistindo que as sociedades europeias aceitariam o uso de ativos russos localizados na Europa para estabilizar a Ucrânia e/ou compensar os gastos europeus com a defesa do país.”
Bruxelas ainda não decidiu a forma final de utilização desses ativos. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou que houve avanços e que uma proposta concreta deve ser apresentada ainda nesta semana.