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Auteur(s): RFI Brasil
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Entrevistas diárias com pessoas de todas as áreas. Artistas, cientistas, professores, economistas, analistas ou personalidades políticas que vivem na França ou estão de passagem por aqui, são convidadas para falar sobre seus projetos e realizações. A conversa é filmada e o vídeo pode ser visto no nosso site.France Médias Monde Sciences sociales
Épisodes
  • 'Nas Entrelinhas': o guia de Maria Marques indispensável para tradutores e aficionados pelo francês
    Dec 15 2025

    Imagine chegar à França nos anos 80, sem internet, sem celular e sem brasileiros por perto. Foi assim que Maria Marques aprendeu francês: mergulhada na vida cotidiana da Córsega, ilha mediterrânea de paisagens deslumbrantes, onde “ou eu falava francês, ou eu falava francês”, como ela resume. Quatro décadas depois, a carioca lançou "Nas Entrelinhas", um guia prático de tradução do francês para o português, pela editora Longarina.

    Formada em Língua e Civilização Inglesa e Francesa pela Sorbonne Nouvelle, Maria atua como tradutora há 35 anos, além de ter sido durante vários anos professora do mestrado de tradução da Escola Superior de Intérpretes e Tradutores de Paris (École Supérieure d'Interprètes et de Traducteurs).

    O livro reúne 1001 verbetes que mostram como uma mesma palavra pode assumir sentidos inesperados conforme o contexto em que é utilizada. “Do francês para o português existem dicionários unilíngues, bilíngues, mas eles não são suficientemente extensos e profundos para as necessidades do tradutor”, observa. “Eles dão uma definição, mas não explicam tudo”, completa.

    A ideia do guia nasceu de uma prática diária: anotar as palavras que a faziam “tropeçar” no momento de escolher a melhor tradução. “Tropeçar é parar, pesquisar, refletir, perguntar para colegas”, conta. Ao longo de 15 anos, Maria colecionou expressões que desafiam tradutores e selecionou aquelas mais frequentes ou mais traiçoeiras. “Na pandemia, percebi que já tinha quase mil verbetes. Com 536 páginas, ficou um guia robusto, mas ainda manejável.”

    Surpresas

    Entre os exemplos, há surpresas para quem pensa conhecer bem o francês. Ménage, por exemplo, ocupa duas páginas. “Os brasileiros conhecem pelo ménage à trois, mas ménage também é lar, casal, família... e faxina!”, brinca. Essa multiplicidade revela, segundo ela, “a capacidade da língua francesa de criar imagens muito ricas”, algo que fascina a tradutora até hoje.

    Maria também coleciona histórias curiosas do ensino. “Uma estudante traduziu a expressão à vol d’oiseau como ‘no voo do pássaro’”, lembra, rindo. “Na verdade, significa ‘em linha reta’. Esse exemplo foi direto para o trono!” Casos assim reforçam a importância do contexto e da sensibilidade cultural na tradução – algo que nenhum dicionário resolve sozinho.

    'Ouvir a música da língua'

    Falando em cultura, Maria destaca um capítulo essencial da sua trajetória: os quatro anos vividos na Córsega, durante a década de 1980. “Não existia internet, nem celular, nem WhatsApp. Então eu lia jornais, revistas, livros, e ficava teimosamente até entender a engrenagem da frase”, conta. Essa imersão, para ela, foi decisiva. “A formação acadêmica é importante, mas não basta. É preciso viver a cultura, ouvir a música da língua.”

    Essa música, aliás, é tão forte que Maria confessa: “Se um dia me disserem: você vai traduzir para português de Portugal ou para francês? Eu prefiro francês. Porque eu tenho a música do francês nos meus ouvidos.” Uma declaração que resume bem a paixão de quem fez da tradução não apenas um ofício, mas uma forma de vida.

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    6 min
  • Álbum acústico de Ricardo Vilas celebra conexões entre música do Brasil e de Angola
    Dec 15 2025

    Após mais de 55 anos de carreira e 28 álbuns, Ricardo Vilas lança Vilas Maravilha, em parceria com o grupo angolano Banda Maravilha. Neste novo trabalho, o músico, pesquisador e produtor celebra o encontro musical entre Brasil e Angola e busca “desmistificar” a cultura africana para os brasileiros.

    Gravado em Luanda e mixado e masterizado no Rio de Janeiro, o álbum reúne 12 faixas e, segundo o compositor, “é um gesto político sonoro de reconexão entre dois territórios irmãos unidos por uma musicalidade compartilhada”. Vilas contou que seu primeiro contato com músicos angolanos ocorreu em Paris, onde se exilou nos anos 1970, durante a ditadura militar no Brasil.

    “Havia muitos angolanos aqui. Angola estava em guerra colonial contra Portugal e muitos tinham saído por causa dessa guerra. O que me impressionou muito porque os músicos angolanos conheciam profundamente a música brasileira e o repertório que estava tocando — e não tinha internet nessa época”, sublinha. “Eles muitas vezes se faziam passar por brasileiros para poder trabalhar, porque a música angolana não tinha muito mercado naquele momento.”

    O contato com a música do país africano despertou a curiosidade do brasileiro, que decidiu realizar uma tese de doutorado para pesquisar a relação entre a música brasileira e a africana. “A gente escuta muito no Brasil que a música brasileira tem raízes africanas, e eu quis entender um pouco mais isso”, diz. “Eu foquei em Angola, que é o país mais próximo de nós, geograficamente e culturalmente.”

    A pesquisa levou Vilas a Angola em 2012, onde fez vários contatos com músicos, “alguns importantes no momento da luta ou da libertação, porque Angola teve uma luta muito selvagem”, afirma, referindo-se à guerra civil que durou de 1975 a 2002. “A música tinha um papel muito importante nesse processo. Foi um cimento para a identidade angolana.”

    “Lá, eu inclusive vi que vários dos músicos importantes da música angolana começaram fazendo música brasileira”, conta, citando nomes como Liceu Vieira, considerado o pai da música popular angolana. “Antes de fundar o grupo paradigmático Ngola Ritmos, ele fez um grupo de música brasileira.”

    Durante essa visita, Vilas também conheceu a Banda Maravilha, uma das mais longevas e conhecidas do país, com quem realizou seu último trabalho.

    Semba e samba

    Em Vilas Maravilha, o músico explora diversos ritmos angolanos e africanos, entre eles o semba.

    “Os angolanos gostam de falar que o samba vem do semba, mas nós sabemos que a primeira gravação do samba considerada oficial foi em 1917, ‘Pelo Telefone’, e o samba se estrutura enquanto música popular nos anos 1950. Quer dizer, o samba não vem do semba”, explica. “Porém, é verdade que o samba e o semba vêm dos batuques e se desenvolveram de forma diferente em Angola e no Brasil”, defende.

    “Então, a raiz comum é essa: a música brasileira tem muito da música africana, com certeza, mas não só. A música brasileira recebeu e recebe muitas influências”, completa.

    Metade das músicas do álbum, totalmente acústico, foi composta por Vilas. As outras seis canções são de compositores tradicionais angolanos, como David Zé e Carlos Lamartini, e também de nomes atuais, como Paulo Flores. Duas composições foram feitas em parceria com Filipe Zau, músico e atual ministro da Cultura de Angola.

    “O Brasil é muito conhecido em Angola, a música brasileira é muito conhecida. O inverso não. É praticamente inexistente a música angolana no Brasil”, lamenta Vilas, que pretende mudar esse olhar. “No Brasil, a música angolana não desperta muito interesse.”

    Para ele, o álbum tem o objetivo de mostrar a proximidade das músicas dos dois países, mas, sobretudo, de “desmistificar” um pouco a cultura africana. “Existe uma África contemporânea, uma África que cria cultura super rica, super diversa”, afirma, dizendo que quer “abrir um pouco os olhos e os ouvidos das pessoas para isso”.

    “Porque a África não é só aquela África ancestral da época dos escravos. Não é só isso”, conclui. “Eu acho que é importante desmistificar e mostrar isso, até para combater o preconceito da sociedade brasileira.”

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    8 min
  • Em romance, Leonardo Tonus defende a literatura da urgência contra a desumanização do migrante
    Dec 10 2025

    Em tempos de fronteiras fechadas e discursos xenófobos, Leonardo Tonus lança um romance que é, antes de tudo, um alerta. "Antes que as palavras te esqueçam" (Editora Cepe) nasce da inquietação diante da naturalização da desumanização do migrante — um fenômeno que transforma pessoas em estatísticas, reduz vidas a imagens de sofrimento e precariedade.

    Professor de Literatura Brasileira na Universidade Sorbonne Nouvelle, em Paris, e referência nos estudos sobre imigração, Tonus constrói sua narrativa em 24 cartas enviadas por L., um brasileiro, a Jamal, refugiado afegão em Berlim. Cartas que nunca recebem resposta. Nesse silêncio, o autor inscreve uma metáfora poderosa: “O vazio do silêncio não existe. O silêncio não é a ausência. Ele cria uma tensão”, afirma.

    Essa tensão é a mesma que atravessa os discursos contemporâneos, onde o migrante se tornou bode expiatório: “O grande problema hoje é a naturalização desse discurso xenófobo. O imigrante se tornou a causa de todos os males do nosso mundo, como se suprimir esse imigrante bastasse para resolver todos os problemas econômicos e sociais — o que sabemos ser uma falácia.”

    Para Tonus, a literatura é resistência: “Eu acredito muito nessa literatura da urgência: falar sobre o que está acontecendo hoje, a questão da denúncia para abrir os olhos do mundo.” Seu romance não é apenas ficção, mas um convite à empatia: “Pessoas em situação de refúgio têm o direito de amar, têm o direito de sorrir, têm o direito simplesmente de viver.”

    A construção do livro também dialoga com uma tradição literária marcada pela urgência. Tonus cita o escritor alemão Hans Fallada, autor de "Morrer sozinho em Berlim", que transformou documentos da Gestapo em ficção para narrar a resistência ao nazismo: “Ele fala: ‘eu vou me servir deliberadamente da ficção, porque a realidade não consigo mais dar conta’.”

    Outro autor que inspirou o escritor paulistano foi o italiano Primo Levi, sobrevivente do Holocausto, que defendia a ficção como única forma de abordar o inenarrável: “Face ao impossível de ser concebido, como um campo de concentração, a ficção permite isso”, destaca Leonardo Tonus. Essa escolha estética reforça a ideia de que, diante da tragédia, a literatura não é fuga, mas ferramenta para compreender o humano.

    Histórias de família

    Essa urgência também é pessoal. Filho e neto de imigrantes italianos, Tonus cresceu ouvindo histórias de travessias e perdas. “Eu digo muitas vezes, brincando, que eu nasci migrante e que toda a minha experiência está ligada ao processo de imigração.”

    Ele lembra que seus avós atravessaram o oceano em um barco de terceira classe e viveram a dificuldade de nunca mais voltar ao país de origem. “É um trauma que me foi transmitido”, afirma. Essa memória familiar, somada à experiência de expatriado voluntário, alimenta sua escrita e sua pesquisa: “Há uma certa proximidade que nos aproxima todos, aqueles que vivem em situação de expatriação, vinculadas ao silêncio, ao olhar que reprova, ao choque cultural.”

    Com uma escrita que oscila entre o íntimo e o político, o livro "Antes que as palavras te esqueçam" devolve humanidade àqueles que a narrativa dominante insiste em silenciar.

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    6 min
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